Caçadas sangrentas, disputas territoriais, coprofagia: o mundo animal não parece lá muito romântico. Quando o assunto é reprodução, geralmente pensamos em cópulas protocolares e uniões breves – aqui e agora, futuro não há. Não parece haver aquilo que dá no coração e faz os pombinhos ficarem juntos para sempre. Mas a verdade é que a monogamia não é uma exclusividade dos humanos.
Lobos cinzentos, cisnes, araras, pinguins – o que esses animais têm em comum? Segundo Renato Ordones, médico-veterinário que atua com animais silvestres, eles são alguns exemplos de espécies monogâmicas, isto é, que passam a vida toda com um só parceiro. “A águia de cabeça branca, por exemplo, migra de forma solitária, mas costuma voltar para o mesmo parceiro nas épocas de acasalamento”, conta o profissional.
Também há estudos citando monogamia em camarões, caranguejos, tubarões, ciclídeos, castores, marsupiais, macacos, entre outros.
Nós dois, um a um
Um artigo escrito por Charlotta Kvarnemo, professora de zoologia na Universidade de Gothenburg (Suécia), deixa claro que a monogamia pode ocorrer unilateralmente na relação. É o que acontece com uma espécie de peixe denominada Ceratias holboelli, cujos machos, significativamente menores do que as fêmeas, permanecem monogâmicos, enquanto suas parceiras podem praticar a poligamia.
Já entre cavalos marinhos, ambos os sexos se beneficiam da monogamia, que costuma render ninhadas maiores.
Quem há de dizer que não existe razão?
Segundo Rafaela Rodrigues Almeida Ribeiro, médica-veterinária que trabalha com ênfase em medicina de animais silvestres e pets não convencionais, a genética é um fator que pode explicar a monogamia nos bichos. “Espécies com nichos ecológicos reduzidos têm maior potencial de serem monogâmicas evolutivamente, por apresentarem certa dificuldade de encontrar um parceiro compatível”, explica.
O artigo de Charlotta aponta a limitação do habitat como um motivo importante para as relações monogâmicas entre mamíferos, aves e peixes marinhos. Isso reduz os parceiros em potencial, e, em alguns casos, pode ser mais vantajoso se fixar a um só companheiro.
Para as borboletas, o tempo é o que acaba limitando o número de parceiros. Por viverem muito pouco durante a fase adulta e terem cópulas demoradas, esses animais tendem a ter um único par durante toda a vida.
A dificuldade do macho em cuidar de muitas fêmeas ao mesmo tempo também pode explicar por que alguns deles copulam exclusivamente com uma determinada companheira.
Outro elemento importante parece ser o sucesso reprodutivo. Por exemplo, nos cavalos marinhos, já mencionados, essa prática costuma gerar mais filhotes, o que é benéfico para a perpetuação da espécie.
Aranhas macho, por sua vez, possuem dois pedipalpos, estruturas que, dentre outras funções, servem para a cópula. Cada pedipalpo só pode ser usado uma vez, de modo que o macho tem duas opções: fecundar duas fêmeas distintas ou praticar a monogamia, fertilizando uma só aranha com o dobro de esperma, o que aumenta as chances de sucesso.
Existem até algumas espécies de pássaros monogâmicos que se “divorciam”, isto é, encontram um novo parceiro, quando não obtém êxito na reprodução.
Além disso, vale lembrar que a monogamia pode ocorrer tanto espontânea quanto forçadamente. No último caso, uma das partes empenha-se em “proteger” a outra de possíveis “pretendentes”, podendo até mesmo se tornar agressiva e matar as rivais, a exemplo do que acontece entre os pardais domésticos.
Por dentro eu te devoro
Em certas espécies, as fêmeas podem forçar a monogamia dos machos para evitar dividir recursos. É por isso que fêmea do louva-a-deus, por exemplo, devora o macho após a cópula. Essa prática é chamada de canibalismo sexual.
Mas não são só elas que fazem de tudo para serem únicas. Alguns insetos machos injetam substâncias na fêmea após a cópula para evitar que ela tenha outros parceiros.