Nós do Bem- Proteção Animal
Felizmente existem pessoas como Paula Picceli, cuja sensibilidade está em cada detalhe do projeto “Nós do Bem”, começando pelo nome, que como ela própria explica na entrevista, a ambiguidade dessas três letrinhas -“nós”- foi pensada para dar nome à ação de uma causa tão nobre. O projeto nasceu em Outubro de 2019 em São Paulo – capital, e hoje é constituído por um grupo de cerca de 30 voluntários apaixonados por animais e ativistas da causa. O trabalho da ONG é de resgatar animais na capital, mas também doar para a região metropolitana e algumas cidades do interior. A missão é criar laços/nós, unir pessoas engajadas, cuidar e amar os animais. Para manter financeiramente as ações, são feitas rifas solidárias de produtos recebidos em doação, vendas de produtos personalizados como máscaras e copos, manutenção de um brechó online- @brechodobem_pelosanimais – e um sistema de apadrinhamento através do catarse, além de doações pontuais recebidas via transferência bancária. Pelos caminhos das redes sociais o Moreno Pet Blog acabou encontrando esse grupo de pessoas que formam esses fortes nós de amor e solidariedade em uma metrópole onde as pessoas estão mais absorvidas pela necessidade da própria sobrevivência.
“Nossa esperança é que a Humanidade perceba como estamos inseridos na natureza e no meio ambiente, e passe a viver com mais consciência quando essa situação da pandemia acabar.”
Marcos Moreno– “Nós do Bem”, esse pronome aqui também tem o sentido de substantivo- referindo-se a “laços apertados”- não é? Como surgiu a ideia de constituir a ONG?
Paula Picceli-Nós do Bem– Isso mesmo, “Nós” tem o significado ambíguo: o coletivo e a união como nós de uma corda.
O grupo que hoje participa do projeto já era envolvido na causa animal, alguns até voluntários em outras ONG`s, inclusive eu. Vez ou outra, me unia à essas pessoas para realizar algum resgate independente por fora da ONG.
Em Agosto de 2019, junto à ONG em que eu era voluntária, resgatei a Estrela, prenha, abandonada após uma desocupação que aconteceu na Cohab de Carapicuíba. A Estrela estava lá, no final da gestação, com uma barriga enorme e magra, muito magra. Não pensamos duas vezes e assumimos o caso.
Acionei alguns contatos dessas pessoas que sempre estavam prontas para ajudar, e juntos conseguimos cuidar dela e de seus 9 filhotes, oferecendo lar temporário, alimentação, medicamento, tratamento e cuidados diários. Este caso me fez perceber como a união de pessoas engajadas é poderosa, e a partir disso decidimos nos unir para formar o projeto Nós do Bem – Proteção Animal.
Marcos– A ONG é formalizada como tal ou ainda não?
Paula- Estamos em processo de formalização do projeto como Associação. A oficialização dos projetos é um processo complexo, pois necessita de advogado, contador mensalmente, um número mínimo de voluntários para o conselho, e por isso vemos muitos projetos pequenos que ainda não são formalizados. Não possuir um CNPJ não significa que um projeto não é sério ou confiável, muitos apenas ainda não chegaram na fase de formalização, mas também merecem apoio!
Marcos- Naturalmente é formada por voluntários. Mas existe alguns profissionais para o trabalho administrativo?
Paula– Durante esse processo de formalização, percebemos a necessidade de ter alguém a frente deste trabalho administrativo. Para tanto, temos uma voluntária que tem experiência no ramo e nos ajuda com esta atividade. Após a formalização, será necessário realizar o pagamento mensal de um contador terceiro.
Marcos- Vocês só recolhem animais machucados/doentes, tratam e colocam para adoção ou também outros animais “sadios”, porém abandonados?
Paula– Nosso critério não é somente a saúde do animal, pois animais que parecem estar saudáveis podem ter problemas sérios de saúde apontados por um hemograma. Resgatamos animais em situações de risco das mais diversas, abandonados, machucados, doentes, acidentados, etc. Todos eles passam pelo tratamento veterinário necessário, são castrados, vacinados e depois doados para famílias responsáveis.
Marcos– No dia-a-dia como são identificados os animais que precisam de ajuda? São denúncias?
Paula– Recebemos muitas denúncias, praticamente todos os dias, tanto nas redes sociais do projeto, quanto através de nossos voluntários individualmente. Para realizar um resgate, nós primeiro investigamos o caso. Por vezes, o animal tem um dono e nesses casos é necessário fazer uma denúncia por maus tratos na delegacia. Após a investigação, levantamos se temos os recursos necessários para o resgate: espaço físico, dinheiro e voluntários disponíveis.
Marcos– As pessoas procuram a ONG para deixar animais que não querem mais? Qual é a política de receber animais?
Paula– Sim. Casos assim às vezes chegam mascarados como denúncia de abandono, e ao chegarmos no local do resgate descobrimos que o animal na verdade tem dono, mas que não quer ou não pode mais cuidar dele.
Nestes casos em que o tutor assume que não ficará mais com o animal, nós o recolhemos, pois entendemos que ele terá uma vida melhor com uma família que estará disposta a cuidá-lo e amá-lo.
Marcos– Como é o espaço físico da ONG?
Paula- No momento não temos um espaço físico para os animais, principalmente pelo lado financeiro. Aluguel de um imóvel, contas de consumo e funcionários são custos fixos altos e infelizmente ainda não podemos arcar. Usamos a estratégia de lares temporários, pagos e solidários, espalhados pela cidade.
Marcos– O abandono de animais é maior em certos países e, dentro dos países, há regiões piores neste caso?
Paula– De maneira geral, regiões mais desenvolvidas tem menos problemas com abandono de animais, pois o poder público trata o problema como questão de saúde pública, realizando campanhas de castração e vacinação. Regiões mais carentes acabam por negligenciar a questão, pois os recursos são mais escassos, destinados à população. Importante pontuar que infelizmente vemos a crueldade humana atuar em todas as faixas de renda.
Marcos– Há, em âmbito nacional, algum órgão público ou político que se preocupe realmente com os animais abandonados no Brasil?
Paula- Vinculado ao Ministério da Saúde, existem os Centros de Controle de Zoonoses (CCZs), que realizam trabalho de castração e vacinação de animais nas cidades que estão presentes. Nas principais capitais esse serviço conta com abrigos para animais retirados das ruas. Em alguns estados, como o caso de São Paulo, existem as Delegacias de Proteção Animal, que recebem e apuram denúncias de abandono e maus tratos aos animais.
O trabalho pesado no Brasil é realizado pelo terceiro setor, que hoje ganha voz por conta das redes sociais e a influência de autoridades e especialistas, que usam de sua força e conhecimento para fomentar cada vez mais o trabalho de ONGs e Associações, proporcionando uma vida digna aos animais.
Marcos– Vocês da ONG acreditam que a consciência humana em relação aos animais é maior hoje? Será melhor algum dia, especialmente por causa da pandemia do Covid -19?
Paula– A internet e as redes sociais uniram pessoas em grandes grupos em prol de uma causa, e a relação com os animais se beneficiou por conta disso. O trabalho de proteção animal ganhou muito alcance e aumentou a conscientização de que os bichinhos também têm sentimentos e merecem respeito.
A pandemia mostrou dois lados da relação da humanidade com os animais. Vimos muitos casos de abandono, e alguns de morte, quando circularam as notícias falsas de que cachorros e gatos eram vetores de transmissão da COVID-19, mostrando o egoísmo destas pessoas. Ao mesmo tempo, durante a quarentena e o isolamento social vimos o número de adoções aumentar. Pessoas descobriram quanto a companhia de um animal é prazerosa e reconfortante. A nossa campanha “Cãorentena” foi um sucesso total – doamos tanto animais na nossa custódia quanto animais de outros projetos.
Nossa esperança é que a Humanidade perceba como estamos inseridos na natureza e no meio ambiente, e passe a viver com mais consciência quando essa situação da pandemia acabar.